Coisas que aconteceram mas não deviam

  1. Habemus Episcopum

Aventurando-se no uso do verbo, a partir da Capela do Lar de Idosos Jesus Maria José (Mónicas) na ilha Terceira, o Vice Lima, via RTP-A, e ao contrário das expectativas que o cenário sugeria, dali não proclamava que a prolongada vacatura na Sé tinha conhecido o seu epílogo. Anunciava, sim, a distribuição de algumas migalhas em apoio aos desvalidos, em toada lamuriosa própria da era pré-Vaticano II. Chamou-lhe pão-por-Deus…

Uns dias mais tarde, mas já em espaço laico, consolava mais uns tantos (sempre em “inho”), desejando-lhes, agora, um Natal um bocadinho mais feliz, com mais uns abonozinhos.

Mais recentemente, o que já não terminou assim muito bem (zinho) foi a inabilidade política com que o Vice tratou de zurzir nesses médicos malandrecos que só querem é dinheirinho…. Foi de tal ordem a bernarda que o esforçado Secretário Clélio teve de proceder a um recuo estratégico, uma vez impedido (hierarquicamente) de desferir merecida reprimenda. Evitada, assim, aquilo que poderia ser uma extemporânea e séria trapalhada coligativa, lá vai José Bolieiro acudir a mais um fogo a juntar-se a muitos outros que por aí vão ardendo sem se ver…

Catarina Cabeceiras, Deputada Regional pela ilha de São Jorge

Definitivamente, aquela liderança de facção de ilha do CDS (ao contrário dos monárquicos que até se têm revelado mais cosmopolitas) fixou-se nas alas mais retrógradas do congénere continental, entretanto varrido do leque dos partidos com assento parlamentar. Mas por cá, uma nova cepa já espreita, mais desempoeirada, e no seio da qual Catarina é nome para se ouvir falar, mais cedo ou mais tarde, seja no CDS, ou, até, quiçá, no PSD…

2. Costa & Costa

O antigo Governador do Banco de Portugal escreveu, em livro lançado recentemente, que o Primeiro Ministro, certa vez, o descompôs em conversa telefónica por ter, alegadamente, maltratado a filha do então Presidente de Angola, país amigo de Portugal. Mas, por que razão coisa tão grave assim terá sucedido? Ao que tudo indica, a tele-ira de Costa deveu-se ao facto de o Governador, numa reunião com accionistas do “Banco BIC”, ter comunicado a Isabel dos Santos (recentemente alvo de um mandado de captura internacional) a conveniência em afastar-se da Administração do “BIC”, uma vez que não lhe reconhecia idoneidade para nela permanecer. Note-se que Carlos Costa referiu, ainda, que o telefonema configurava, também, uma forma inadmissível de pressão política sobre o Banco de Portugal.

Vai daqui, António Costa processou o Governador porque, diz, o que está escrito no livro sobre o tal telefonema não passa de declarações mentirosas, “ofensivas da minha honra, do meu bom nome e da minha consideração”.

Ora, ao mais alto nível das esferas do Estado, lá onde as relações institucionais, cordatas e leais entre os titulares das respectivas instituições deveriam constituir o paradigma a seguir até ao último degrau da pirâmide hierárquica, reina, afinal, a mesquinhez, a desconfiança, o protagonismo patológico.

Quando um dos lados mente, e já que aqui a mais elementar lógica nos veda qualquer alternativa – ainda que se possa tratar da “nobre mentira” de Platão… – restará aos actores judiciais dirimir a contenda. Nestes casos, a verdade é normalmente diluída, e a responsabilidade partilhada, como nos desaguisados entre alunos na escola. E, para o efeito, recorre-se habitualmente aos instrumentos da retórica, onde o jogo semântico dá cartas e sempre empolga, à boa medida de Protágoras, o sofista, e sem desfechos conclusivos, como nos diálogos de Platão…

Enfim, quando lá em cima é o que se vê (quando se vê), e quando a descer é o que se sabe, é pouco provável que se consiga mobilizar um país em torno de causas e objectivos de progresso social e prosperidade económica, que se consiga combater a abstenção, ou impedir o avanço da extrema-direita. Por isso, mais vale que nos entretenhamos em pública e destemida cruzada em terra de mouros obscurantistas, em prol da democracia e dos direitos humanos, de preferência no Catar, país de forte tradição futebolística! Aliás, o “mundo ocidental” parece ter acordado para um “Mundial” que, embora há muito programado, só agora gera tamanha indignação…

A propósito, Odemira fica ali, no Alentejo. Vi e ouvi, hoje, num canal de TV, que aí existe tráfico de seres humanos e escravatura.

Luís Bastos

Um vivo fim-de-semana de Outono na Praia da Vitória

O festival literário Outono Vivo 2022 aconteceu, por terras de liberais e de Nemésio, entre 28 de Outubro e 13 de Novembro últimos, no Auditório do Ramo Grande e na Academia de Juventude e das Artes da Ilha Terceira.

Constituindo uma iniciativa cultural anual, já com tradição, da Câmara Municipal da Praia da Vitória, em parceria com outras entidades e livreiros locais, como é o caso do conhecido empresário do sector Carlos Lima, desta vez, o festival contou com nomes sonantes da literatura, nos seus vários géneros, levados pela mão de muitas editoras, regionais e nacionais, que marcaram presença numa “feira do livro” composta por mais de vinte mil títulos, ocupando já o 5.º lugar do país no que respeita ao volume total de vendas.

A par de outras actividades, como os concertos musicais, a pintura ou o artesanato, apresentaram as suas novas obras ou edições, entre outros, os autores Avelino de Meneses (Gaspar Frutuoso, o Homem e a Obra), Pedro Almeida Maia (A Escrava Açoriana), Nuno Costa Santos, com a nova edição da revista Grotta, Álamo de Oliveira (Quadras Silvestres) e o historiador Carlos Enes (Álbum Terceirense).

Neste fim-de-semana último, que se manteve soalheiro e de amenas temperaturas, a cidade conheceu a animação desusada que eventos desta natureza sempre provocam em alguns dos seus espaços de estilo mais emblemáticos. E os inúmeros forasteiros, desembarcados dos navios de cruzeiro atracados no porto que se abre para um oceano a perder de vista, emprestavam à bonita “marginal” da Praia um cunho cosmopolita denunciado pelos nossos sentidos que do ar captavam agradáveis e exóticos aromas da mistura das gentes provindas de todo mundo, bem como o som de mil linguajares, uns estranhos, outros nem tanto.

Foi nesta ambiência que, no passado Domingo, dia 13, na Academia de Juventude e das Artes da Ilha Terceira, tive a honra e o prazer de integrar um painel constituído pela Presidente da Câmara Municipal da Praia da Vitória, Vânia Ferreira, por João Bosco Mota Amaral e Nuno Costa Santos.

Perante um auditório muito interessado, foi agradável ali estar para falar da Autonomia e da sua história mais recente (e não só…), a partir do livro de que sou autor, João Bosco Mota Amaral – Fotobiografia, numa bela edição das “Letras Lavadas”. Agradeço ao Nuno a disponibilidade que demonstrou em aceitar o repto que, oportunamente, lhe havia lançado – ser o principal instigador de uma conversa comigo, e na presença do foto-biografado, sobre política (que é, afinal, do que o livro trata), matéria que da sociedade civil açoriana vai sendo, perigosamente, arredada. E o Nuno, como é seu timbre, fê-lo com a competência e com a inteligência a que há muito nos habituou.

Mas a organização, aliás exímia, do “Outono Vivo”, conseguiu que naquela noite o lado nobre da política tomasse conta do amplo e confortável bar da Academia de Juventude e das Artes da Ilha Terceira. O foto-biografado, Mota Amaral, encerrou a sessão com chave de ouro e com um entusiasmo e vigor que há muito não o víamos impregnar no discurso político…

Parabéns à Câmara Municipal da Praia da Vitória e a todos os que contribuíram para o sucesso que constituiu esta edição do “Outono Vivo”.

Luís Bastos