O mito da escola inclusiva

Nos Açores, existem mais de 4.000 alunos com necessidades educativas especiais (NEE), a frequentar as escolas regulares.

Todos eles estão abrangidos por um Programa Educativo Individual (PEI), para além de medidas educativas específicas tais como, Apoio Pedagógico Personalizado (APP), Adequações Curriculares Individuais (ACI), Adequações no Processo de Avaliação (APA), Currículo Específico Individual (CEI) e Tecnologias de Apoio (TA).

As deficiências dos alunos “NEE” são, pelo menos em algumas escolas, dos mais diversos tipos e vão desde os vários graus de défice cognitivo (em número muito elevado), incluindo a trissomia 21, ao autismo, passando pela paralisia cerebral até outras deficiências como, nomeadamente, a dislexia (em elevadíssimo número) e as de natureza sensorial. Cada tipo de deficiência, uma vez  sinalizada, exige, obviamente, uma estratégia  de intervenção diferenciada.

 Como se sabe, um dos principais objectivos da escola inclusiva é o da integração, sempre que  possível, das referidas crianças e adolescentes nas turmas compostas por alunos do ensino regular. Este conceito pressupõe que os alunos portadores de deficiência, não sejam discriminados em relação aos outros colegas, devendo a escola criar e desenvolver as condições necessárias à promoção de uma saudável socialização entre todos. Claro que nem toda a deficiência reclama esforço de integração, como, por exemplo, a dislexia.

Ora, existem escolas cujo numero de alunos portadores de deficiência ultrapassa, largamente, a centena e o número de professores do quadro de educação especial não vai além de dois ou três! Estes, lá vão dando  o apoio técnico possível aos professores do ensino regular que ensinam os alunos sem que e para este efeito, tenham recebido, na sua maioria esmagadora – refiro-me essencialmente aos professores do terceiro ciclo e do ensino secundário – qualquer tipo de formação! Só a capacidade de improvisação e a resiliência de muitos docentes garantem, infelizmente apenas na aparência, uma escola  que se vai apregoando  como inclusiva.

Dada a escassez de recursos técnicos e humanos, os professores de educação especial desdobram-se em árduos e desgastantes trabalhos burocráticos diários para assegurar, pelo menos, o despiste e o diagnóstico, bem como, a já de si difícil tarefa de integração (que não a de inclusão) de boa parte destas crianças e jovens.

Entretanto,  realmente  urgente é estudar e  tomar  as medidas necessárias  para que a  guetização deste sector, no espaço escola, deixe de constituir uma triste realidade. Volvidos cerca de vinte anos, a escola inclusiva é ainda um projecto eivado de utopias.  É  preciso fazer muito mais do que  proceder à simples transferência dos alunos para o ensino regular, tornando-se imperioso perceber o que falhou.

Finalmente, é  notória a angústia de muitos encarregados de educação, por temerem o fim da escolaridade dos seus filhos sem que se abram  perspectivas de inserção dos mesmos no mercado de trabalho ou noutra actividade ocupacional. Importa atender  a esta outra realidade intrínseca ao sistema e  que em  muito contribui para a instabilidade emocional de famílias já de si fragilizadas. Também aqui se torna desejável uma melhor articulação entre os vários agentes de educação e do emprego, bem como proceder a um estudo sério sobre a criação de centros de actividades ocupacionais para estes jovens, uma vez saídos do sistema de ensino.

No passado mês de Novembro, por despacho do Secretário Regional da Educação , foi nomeada  uma comissão para “elaboração de um relatório que faça o diagnóstico e identifique as mudanças necessárias na educação especial.”

Aproveitem então e fujam à tentação de produzir mais legislação em vez de a simplificar, tornando-a acessível a toda a comunidade escolar e dotando-a da dose de realismo e pragmatismo que as circunstâncias e, sobretudo, as expectativas  dos mais directamente  envolvidos, aconselham.

Bom trabalho!

 

Luís Bastos

 

Duelo de Banjos

Autor: Luís Bastos

Licenciado em Filosofia; Mestre em filosofia contemporânea. Interesses: filosofia e ciência politica; ética; filosofia da ciência; artes; história; património cultural. Blogue: azoreantorpor.wordpress.com

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